‘Estamos traduzindo a Bíblia em abrigos antiaéreos’, diz cristão na Ucrânia
- 17/04/2024
O tradutor de Bíblia Steven K*, que trabalha na Ucrânia devastada pela guerra, compara a situação do país à dor de um câncer incurável, indicando a dificuldade inimaginável enfrentada por milhões de pessoas naquele país.
Ele destaca a importância de levar a palavra de Deus às pessoas em sua língua materna, apesar dos perigos envolvidos.
Segundo relata, a situação piora a cada dia na Ucrânia, com ataques diários de foguetes que duram de 3 a 5 horas, além da falta de água quente há meses.
Os suprimentos de ajuda humanitária estão diminuindo devido à escassez de voluntários e doadores. Com o aumento dos preços dos alimentos e da energia, as famílias lutam para se manterem aquecidas e alimentadas.
“Apesar disso, continuamos traduzindo a Bíblia para mais de 540 línguas faladas nos países da antiga União Soviética. Isto afeta mais de 161 milhões de pessoas na Ucrânia e noutros países controlados pela antiga União Soviética, que precisam de ouvir a palavra de Deus na língua materna e não em russo”, diz Steven.
Ele relata que em meio ao conflito, a Igreja na Ucrânia se tornou um refúgio para muitas pessoas, independentemente de sua nacionalidade ou status social.
“Agora, mais do que nunca, tanto os líderes leigos como os ministros da igreja precisam de apoio moral e espiritual”, afirma.
E continua: “Em tudo isso, minha família e eu enfrentamos dificuldades extremas. Dois meses depois de um grave ataque onde vivíamos em Kharkiv, tomamos a decisão fatídica de encerrar todas as redes sociais, nos separar e viajar em direções diferentes”.
Steven diz que foi preciso evacuar seus pais, sobrinho e tia deficiente para um local seguro, e ele mesmo foi separado da esposa, que estava presa em uma zona ocupada pela Rússia.
Compartilhando a Palavra
“Durante a evacuação, fui ajudado por um diácono da igreja que não considerou arriscar sua própria vida ou família ao me ajudar”, diz.
“Guardamos exemplares raros da Bíblia, levando conosco as pesadas gavetas de livros do quinto andar do meu prédio. A igreja local veio ajudar a encher dois terços da nossa van com diferentes traduções da Bíblia”.
El conta que “tudo o que trouxe comigo foi para dar aos outros. Impressora, scanner, papel, toalhas, lençóis – tudo. Orei durante todo o caminho para que nossa van não quebrasse, para que não ficássemos presos em um lugar deserto, ao ar livre.”
Felizmente, deu tudo certo e após chegar a um local mais seguro, Steven reencontrou sua esposa, deixando ambos aliviados.
“Este diácono salvou a mim e às Escrituras, para que o maior número possível de pessoas possa conhecer a palavra de Deus no futuro”, testemunha.
Abrigos antiaéreos e estações de metrô
A guerra na Ucrânia está se desenrolado há mais de dois anos, gerando inúmeros desafios para o trabalho missionário e de tradutores da Bíblia.
Devido ao risco constante de ataques de foguetes, os tradutores priorizam a segurança das pessoas que os acompanham. “A falta de um local fixo para traduzir a Bíblia nos deixa sem estabilidade, nos obrigando a mudar de ambiente frequentemente, de uma câmara fria em um abrigo antiaéreo para uma estação de metrô movimentada”.
Nos últimos meses, os tradutores da Bíblia de um dos grupos de pessoas com quem trabalhamos ficaram sem trabalho ou renda. A qualquer momento, a eletricidade pode acabar, o que significa que a nossa água, comunicações e calor desaparecem. Quando isso acontecer, não sabemos quando voltarão.
‘Não sei se voltarei’
Steven diz que a sensação de insegurança nesses dois anos de guerra permanece, que dentro ou fora de casa não tem certeza se conseguirá se proteger.
“Vou à loja sem saber se voltarei vivo. Enquanto uso o banheiro, temo que uma bomba entre no meu apartamento. Todo dia é difícil. Mesmo cansados do inesperado, continuamos nosso trabalho porque a necessidade é grande.”
“No final de 2023, havíamos concluído a tradução de 1 e 2 Timóteo, 2 João e dos livros de Obadias, Ester e Esdras. Se a situação não piorar, começaremos agora a traduzir o livro de Neemias”, relata.
Steven diz que o trabalho que realizam é por aqueles de outros países que foram forçados a falar russo durante mais de 70 anos sob o domínio da antiga União Soviética.
“Muitos nunca se tornaram fluentes em russo e hoje a maioria continua a usar a sua língua materna em casa”, diz.
“Eles precisam que esse trabalho continue. Eles precisam de acesso à palavra de Deus na linguagem do coração”.
*Nome alterado por segurança